PARANGOLÁ: O PARADOXO DA REDUNDÂNCIA
Sergio Guerra
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Sinopse
Parangolá traz quase uma centena de imagens de antenas, todas elas capturadas em Angola, na sua maioria em Luanda, a capital do país. Mas a despeito disso, não pede para ser visto estritamente como um livro de fotografias. Sua intenção é muito mais reflexiva do que estética ou mesmo documental. Ao folhear o livro, tem-se a nítida impressão de que as suas imagens, ou a maior parte delas, não perseguem a singularidade de um registro único. Cada imagem existe por causa da outra, existe para a profusão de todas as outras imagens. São deliberadamente replicantes. O fotógrafo imita as qualidades do seu objeto. Suas fotos são como as antenas descritas por Arnaldo Antunes num texto do livro: se alastram e se proliferam sem nenhum controle de natalidade. São como espelhos que refletem e multiplicam o caos urbano, os seus fantasmas de concreto e metal, seus escombros, seus milhares de antenas, suas garras voltadas para o alto, sua impressionante vontade de sair para fora. O autor optou pela redundância, nem sempre agradável ao olhar mais diletante, para melhor enfatizar os destroços da guerra, os despojos da utopia socialista, o desejo irreprimível de ascensão social, a vontade de universalização e integração, manifestada por uma sociedade na periferia do ocidente. Numa palavra, os paradoxos e os abismos daquilo que chamamos de globalização. Estamos num mundo confuso e confusamente percebido?. Esta é uma das senhas que Guerra nos oferece, colhida não por acaso nas páginas do geógrafo Milton Santos. Para ele, a idéia de uma aldeia global não passa de uma fábula. Uma fábula, por conta da sua ainda excessiva unilateralidade. Uma fábula porque o acelerado e compulsivo acesso aos artefatos técnicos da globalização põe mundos em convívio, sem lhes assegurar necessariamente a experiência de uma comunidade universal. É certo que estamos longe de experimentar a redentora vivência da aldeia global. Talvez, o seu maior protagonista ainda seja o capital, como afirmam os críticos mais frontais. Mas o que vemos no céu de Angola não são apenas as certezas e as ilusões que alimentam os discursos acerca da globalização. São ricos paradoxos. Se por um lado fazem eco à crítica do professor Milton Santos, por outro confirmam as suas esperanças de que o tempo real, compreendido como um património coletivo da humanidade, é um ideal alcançável.