Sinopse
Memorial do Convento é um exemplo de coesão interna e de percurso bem determinado, representando Blimunda o eixo aglutinador que legitima todo o fazer discursivo. Mesmo quando dela não se fala, mesmo quando se representa a Corte, é sempre por contraste, por oposição, para marcar a diferença, para legitimar a atração indefinível por um mundo outro, liberto do peso de um quotidiano opressivo e dissimulado. À indiferença e funcionalidade normativa do casal régio contrapõe-se a comunhão decorrente da vontade individual de cada um dos elementos do casal popular. Representando uma oposição tácita mas segura, Baltasar e Blimunda destroem a imobilidade, o cerimonial e o conceito atávico de poder. É essa destruição lenta, progressiva, sistemática que o romance demonstra, mesmo se nem sempre é evidente, se há circunlóquios, se há aparentes fugas a uma linearidade conceptual. Os avanços e recuos simbólicos mais não são do que os momentos necessários de consolidação de um significado que ultrapassa os vários sentidos factuais para se instalar no domínio do maravilhoso.