Sinopse
Uma cadeira é uma coisa. E uma pedra, uma nuvem, uma folha. O mundo todo é uma coisa, escreveu Kant. Tudo que existe é uma coisa. Tudo menos, para alguma filosofia e em muita pintura, a figura humana, uma interrupção nesse largo contínuo que é o mundo das coisas.Mas em pintura há um gênero em que coisas e homens se tornam uma unidade: a paisagem. A partir do século XVIII, a nascente ciência moderna era uma disciplina que dividia a natureza em suas partes para analisá-las. Ao lado, a pintura (e a pintura de paisagens) já era uma atividade de síntese propondo a unidade entre as emoções (a estética), os atos (a moral) e o conhecimento (a lógica) a unificação de todas as coisas.Tem sido assim desde a Renascença. Essas pinturas de paisagens contavam uma história importante que as pessoas conheciam. Uma história de conteúdos morais: o carvalho representava a coragem; os álamos, a dor; a salamandra, o mal (no século XXI não sabemos mais ler essas coisas: cultura e natureza se divorciaram). Nesta mostra, porém, não há só paisagens. Nem somente paisagens da natureza identificada com o campo. Há marinhas, naturezas-mortas e as paisagens culturais que são as paisagens urbanas. É a natureza dessas coisas que esta mostra busca revelar. Hoje, é fato, o mistério das coisas se esvaiu, acompanhando o desencantamento do mundo. Se há uma imagem exata de como se sente o homem contemporâneo diante das coisas (e das "velhas" pinturas de paisagem) são estas palavras de Fernando Pessoa: "O único sentido oculto das cousas / é elas não terem sentido oculto nenhum [...] as cousas não têm significação, têm existência. / As cousas são o único sentido oculto das cousas".E o poeta continua para dizer que "Não basta abrir a janela / para ver os campos e o rio./Não é bastante não ser cego /para ver as árvores e as flores. / É preciso também não ter filosofia nenhuma."