Sinopse
Muito se escreveu sobre a importância da produção de imagens na literatura. Pouca atenção foi dada às condições de possibilidade da percepção desses mesmos mundo-imagens, ou seja, aos actantes e às agências internas ao poema e à poesia. Qual seria o lugar do transumano na literatura? Quais as implicações de uma alteração do estatuto ontológico do narrador? Como abordar as zonas de indiscernibilidade dos sentidos e dos percipientes? Este brilhante livro-poema de estreia de Verônica Ramalho traz essa preocupação em cada uma de suas linhas. Realiza assim um tipo de escrita ainda pouquíssimo explorada na literatura brasileira: uma escrita celular.Verônica propõe uma microscopia da percepção. O atomismo de uma linguagem-organismo, entendida simultaneamente como palavra e mulher, destino e corpo. Esta forma-consciência flutuante e esses olhos-multiplicidade se apresentam como uma lente multidimensional, oscilando entre as palavras e as coisas. Somos capturados pelo deambular oblíquo de olhos-vidros, olhos-peixes, olhos-unhas, olhos-pedras, olhos-lodo, olhos-conchas e olhos-dentes que tateiam toda sorte de sons, cheiros, sabores e formas. Como mônadas, a infinidade de átomos metafísicos que se pluralizam e se dissipam, dilatam-se e se reúnem para configurar o universo, estes mil olhos produzem mil reverberações e prismas. E, no entanto, em nenhum momento deixam de nos remeter ao devir do mundo-mulher de onde emergem.