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UM CORPO DIVISÍVEL

Paulo Abe
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Sinopse
Resenha: A dupla linguagem do literário em Um corpo divisível, de Paulo AbeAlexandra Vieira de Almeida – Escritora e Doutora em Literatura Comparada (UERJ)No livro de contos Um corpo divisível, de Paulo Abe (Penalux, 2019), encontramos atemática dos irmãos gêmeos que se densifica na própria relação ambígua do literário,que ora aponta para o real, como seu duplo, o ficcional. O processo de geminação daescrita desdobra cada conto como duplo de outro conto a se espiralar barrocamente até oinfinito, fazendo-nos lembrar da biblioteca infinita de Jorge Luís Borges. Paulo Abe diz: Esta história está entre a ficção e a biografia; a ilusão e a realidade. Tal encontro sepoderia chamar de um estudo dicotômico, um paradoxo que em seu pendular internoprocura contradizer-se”. A escolha da simbologia dos gêmeos aponta para umametáfora. Os irmãos, Paulo e Marcos, são a metáfora mesma da tessitura do textoliterário que reúne a ambiguidade de sentidos. O narrador principal Paulo, o irmãogêmeo mais velho e que é o mesmo nome do autor nos revela os matizes que quebramas fronteiras entre o real e seu duplo, a literariedade.Numa estruturação antinatural, indo da velhice dos gêmeos à sua infância atédesembocar no final no útero da mãe, o livro nos aponta para uma involução e gradaçãodecrescente inusitadas. Num retorno à origem, Paulo Abe, consegue de formaimpressionante, partir da morte ao nascimento, do caos à ordem placentária quedireciona os dois seres à união e desunião dos sentidos e afetos. A irmandade” équebrada pelas diferenças, em que ambos se separam justamente pela negação do unopara se atingir o dual ou o múltiplo. O livro é regido pelos esquemas das analogias esemelhanças. É como se cada conto desencadeasse o posterior num desdobramento dasvírgulas às reticências e reentrâncias da escrita. O espelho, símbolo mesmo destaduplicidade reflete-se no final numa casa de vidro, um labirinto, em que perder-se éganhar sua verdadeira identidade e o processo de individuação. Se Dionísio é o Caos,Apolo, por outro lado, os leva à separação e ordenação dos mundos individuais,levando-os à conscientização do ego. Retiram-se as máscaras e o que resta são asverdadeiras personas em todo o seu teor simbólico e inaugural. Uma realidade vista pelaprimeira vez é esboçada e contorna os rostos idênticos das palavras que ganhamdiferenciações múltiplas a partir do jogo metafórico com que Paulo Abe descortina arealidade.Além desse processo genial de nos revelar a ambivalência do literário, o narrador vaiexplicando as razões da narrativa, seu constructo literário, numa conversa inventiva comseu caro leitor”. Cada conto é irmão gêmeo do anterior com suas diferenciações edesarticulações. A escrita revela seus duplos. Com a lei da repetição e da diferença comritmo e, ao mesmo tempo, com desarticulação. Os contos se encaixam tãoprofundamente como se fossem um romance, com seus prolongamentos e distinções. E,ao mesmo tempo, o livro se estrutura como a vida deles, a experiência. Como dizia opré-socrático Heráclito, temos uma harmonia dos contrários”, pois o que é duplo sedivide e se soma ao mesmo tempo, produzindo-se, assim, suas fagulhas de introspecçãoe extrospecção. O importante no livro é descobrir a identidade de cada um em meio aomosaico de coisas unas. O mundo dos sonhos e da realidade se cinde e se reúne nummesmo respiro. O que ocorre nos sonhos do narrador-personagem se reflete no real,fundindo as camadas opostas num mesmo vislumbre. Nesse duplo, novamente, temos asimagens do ficcional e do factual num trabalho de autoficcção perfeito.A morte e a vida se conjugam. Aniquilar o ego é fugir deste estigma de ser irmãogêmeo? O um é separado. O que era unido se separa, se cinde, formando um corpodivisível”, como o próprio título do livro aponta. Fugindo da lógica matemática, onarrador-personagem procura um momento de imprecisão. Aquilo que possa ferir aracionalidade de morte súbita como num relâmpago. Eles são, ao mesmo tempo, inteirose metades, o individual e a outridade, fora da matematização do universo, eis oparadoxo. A estrutura da narrativa é mesmo um paradoxo, uma anomalia, pois hibridizapolaridades, sendo um romance-conto. Os irmãos trocam de papéis, usando máscarasdramáticas, sendo que o narrador-personagem utiliza-se do lugar de fala de seu irmãogêmeo Marcos e até de seu pai, ao falar do nascimento. Paulo se põe no lugar deMarcos, de seu pai e até de irmãs gêmeas que polarizam com os dois, Paulo e Marcos.Se a escrita de Paulo Abe se reutiliza de outros elementos anteriores, a invenção donovo aparece a partir da utilização de neologismos.Essa estrutura narrativa geminada revela a indistinção dos dois irmãos, pois uma dasamigas de um deles diz: Você é você ou você é seu irmão”. Outros duplos comparecemnas suas belíssimas histórias que têm um encanto todo novo. O nós, o maior e o duplorecorrem ao eu, ao menor e o único. As geminações vão se ampliando, outros eus,outros duplos. E a crítica à família nos mostra os tentáculos com que ela os cobre paraque seus filhos sejam extensões de outros seres, os pais. Aí temos uma camada daviolência familiar que acomete tantos gêmeos nas histórias, como as irmãs em que afamília quer que sejam cantoras. A duplicidade aqui também se faz presente, mas aqui,com seu viés perverso. Nesses dez contos de Paulo Abe, encontramos num deles, umasingularidade e uma diferença. O quinto conto se chama O corpo divisível”,distinguindo-se pelo artigo, do título do livro. Enquanto o título representa aindefinição, o conto representa a definição através de um artigo definido. Esses matizesnos fazem pensar sobre a ambiguidade desse corpo divisível, que ora aponta para aindistinção caótica, ora nos mostra a busca de uma identidade, uma divisão sensata emmeio à massa indistinta da realidade. Paulo Abe se distingue e se confunde com seuirmão e ambos morrem na aurora latente dos sentidos.Além das analogias já apontadas, no quinto conto, Paulo Abe nos apresenta analogiasem conhecimentos marcadamente distintos em nossa sociedade, geminando-os, aciência e a religião. Essas semelhanças ao longo do livro são fantásticas, mostrando quehá pontes entre desníveis de áreas diferenciadas, mas que pela nudez do literário,retiram suas máscaras. O narrador-personagem mostra um anel, um círculo, com seufim e início, mas os rasgam a partir do símbolo do infinito que aponta para váriasdireções. O oito deitado representa dois círculos que expandem o círculo inicial paraalgo em sua amplidão e descomedimento. O pensador Clément Rosset no seu livro Oreal e seu duplo, já nos apontava esta duplicidade na vida dos homens, que segundoDiderot, caracterizaria o ator em cena: vir a ser todos sem ser ninguém”. Tomando olugar do outro, Paulo quer se expandir através do literário, querendo ultrapassar ageminação e atingir sua própria individualidade. Nas variações de um mesmo tema,Paulo Abe encontra seus duplos linguísticos. A troca de identidades, a fala do outro, éum processo narrativo de ficcionalização do ser. Buscando os significados dos gêmeosna mitologia, temos as figuras de Castor e Pólux, que segundo Macaulay em seus Cantos da Roma Antiga”: Tão semelhantes eram, que os mortais/Um do outro jamaisdistinguiriam”. E no Dicionário de símbolos, Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, assimmencionam sobre o verbete gêmeos”: Quando eles simbolizam, assim, as oposiçõesinternas do homem e o combate que ele tem de travar para superá-las, revestemsignificado sacrifical: a necessidade de uma abnegação, da destruição ou da submissão,do abandono de uma parte de si mesma, para o triunfo da outra”.Portanto, este livro de contos excepcional de Paulo Abe encontra a medida certa parafalar dos paradoxos da vida e da linguagem. Permeado pelos encontros e desencontros,atração e repulsão, silêncio e palavra, esquecimento e memória, o livro vem enfatizar aambiguidade do literário que se espelha na metáfora dos gêmeos”. Uma obraenvolvente que vem falar da experiência de vida desses seres tão especiais queconquistam sua individuação pela ambiguidade da escrita que não quer se calar. Osilêncio em sua selvageria encontra a palavra, essa reflete o real que não fracassaperante sua captura no texto escrito que nos mostra o poder de diversificar as formasatravés de um mesmo conteúdo. Que seu livro conquiste cada vez mais leitores. E queeles busquem a força da palavra enigmática de Paulo Abe.

Categoria
Editora Penalux
ISBN-13 9788558335188
ISBN 8558335184
Edição 1 / 2019
Idioma Português
Páginas 106
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