Sinopse
Edmund Burke (1730 1797) é um dos nomes centrais da história das ideias políticas. Mas será Burke um autor filosoficamente coerente? Ou apenas alguém que respondia aos desafios do seu tempo sem radicar as suas posições numa particular teoria política? Este ensaio defende a consistência do pensamento de Burke, alicerçada na sua reflexão sobre a natureza humana.O problema dos dois Burkes ocupou os melhores espíritos nos últimos duzentos anos. Se, como foi escrito, a interpretação utilitarista foi dominante no século XIX, o século XX teria reinterpretado Burke como um autor naturalista ou, na formulação de Francis Canavan, alguém que determinava a acção política de acordo com princípios morais primários e imutáveis.Acontece que, já no nosso século, o debate parece ter conhecido uma relevante mutação: procurar o utilitarismo ou o naturalismo de Burke passou a ser vista como uma tarefa inglória e ilusória. Nos importantes trabalhos de F.P. Lock, Christopher J. Insole ou Richard Bourke somos constantemente alertados para o facto de Edmund Burke não ser um filósofo mas um político, sem as preocupações de consistência teórica que são mais próprias dos teóricos. Para Lock, o talento político de Burke está na forma como o ilustre parlamentar irlandês recorria a ambas as escolas de acordo com as circunstâncias. Christopher J. Insole vai ainda mais longe: depois declarar que a linguagem naturalista de Burke não é sistemática nem frequente uma afirmação que, à luz do que ficou escrito, nos parece extravagante Insole ressoa Lock ao concluir: Burke serve-se estratégica e esparsamente da tradição da lei natural. Igual posição é avançada por Richard Bourke, que nos convida a abandonar a busca de uma consistência de pensamento em Burke. No fundo, escreve o autor, o seu objectivo era defender uma particular acção num particular tempo. Isso levava Burke a usar diversos autores e diversas tradições filosóficas para fazer valer o seu ponto de vista. (Apesar de tudo, Bourke reconhece que a carreira política e intelectual de Burke sempre se fez contra o espírito de conquista e em nome de um espírito de liberdade).Este ensaio distancia-se das modas do tempo de qualquer tempo, aliás para retomar uma problemática que, mesmo por negação, persiste nos estudos burkeanos. E o nosso propósito foi o de mostrar que uma leitura dos textos de Burke revela uma dupla concepção de natureza humana que acompanha o autor na forma como respondeu aos desafios políticos do seu tempo.