RECUPERAR O DESEJO DA LIBERDADE E CONTER O PODER

Os textos reunidos nesse primeiro e nos demais volumes de Escritos sobre a Liberdade propõem mais do que a indispensável e urgente contenção do agigantado poder punitivo. O desejo da liberdade, a concretização dos direitos fundamentais de cada indivíduo, o aprofundamento dos ideais democráticos, na realidade, não se harmonizam com a existência de um poder punitivo, agigantado ou mais controlado. A leitura evidenciará o escandaloso paradoxo da existência, em uma democracia, de um poder concedido ao Estado para punir e, assim, para produzir e distribuir danos, violência, dores, desigualdades, estigmas, exclusões. O desejo da liberdade e o compromisso com a efetiva realização dos ideais democráticos desembocam naturalmente não na utópica, mas na real perspectiva do fim desse poder, na real perspectiva de uma futura abolição do sistema penal.Diante das tendências dominantes favorecedoras do agigantado poder punitivo, pensar e propor a abolição do sistema penal talvez possa parecer uma pretensão excessivamente à contramão. Mas situar-se na contramão de tendências dominantes em um determinado momento histórico é apenas uma contingência, que longe está de significar qualquer impossibilidade de reverter essa mão. Pouco importa se o futuro possa parecer distante. Não sejamos conformistas, nem nos preocupemos com o tempo. Não sejamos submissos a nenhuma tendência. Não sejamos submissos a nada. Sejamos livres sempre. Sejamos idealistas e sonhadores sim e, ao mesmo tempo, realistas. Sigamos a palavra de ordem que, no simbólico e inesquecível ano de 1968, aparecia escrita nos muros de Paris sejamos realistas, peçamos o impossível! - Maria Lúcia Karam